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Terapia Entrevista Elder Silva Raimundo

Qual é o papel da filosofia na sua escrita? Como você integra conceitos filosóficos em suas obras literárias?

A compreensão do mundo em que vivemos é perpassada por um distanciamento da vida real, um afastamento necessário para contemplar o que está acontecendo. A filosofia me oferece essa perspectiva e por isso escrevo sobre ela, como que tentando não ser esmagado pela velocidade de informações e acontecimentos que tentam nos robotizar nos dias atuais. A minha escrita é divida em duas linhas distintas: As obras literárias, em que uso conceitos filosóficos complexos, mas que são
apresentados em uma narrativa, repleta de exemplos e compreensíveis. Poucas pessoas estão dispostas a ler ensaios complexos sobre qualquer produção na área das humanidades, daí a importância da literatura, dentre outras tantas utilidades, além do deleite por ele mesmo. A outra linha é a resenha crítica, em que apresento trechos de todas as obras de autores clássicos e ofereço a interpretação deles.

Não seria possível citar todos aqui, pois cada um tem sua parcela significativa de contribuição, inclusive literatos que podem não ser filósofos na classificação da fortuna crítica, mas muito contribuíram para meu modo de ver o mundo. De Platão vem a organização, onde tudo começou e dos gregos platônicos em geral. De Kant o rigor e a necessidade de buscar respostas. De Nietzsche, a ideia de que nem tudo é um maniqueísmo e de que a vida contempla em si situações “além do bem e do mal”, que
tudo se acha imbricado e o fim de um conceito é invadido pelo conceito oposto. Além disso, tem os não filósofos que leio compulsivamente: Dostoiévski (o principal), Kafka, Freud, Gramsci, Bauman, Jorge Luís Borges, Machado, Aluísio de Azevedo, Camus e citando assim, quase que esqueci de classificar o Sartre como um filósofo, mas adoro os existencialistas, no sentido de deixar claro que somos mais daquilo que “nascemos para ser”; de que apesar das contingências que são nossas, há um vasto espaço para “nos 
fazer na existência”. Tem muito autor do leste europeu que aprecio também: como Milan Kundera e o Emil Cioran, este último, mostrando que há possibilidade de vida, por mais desesperadora que ela se apresenta em algumas ocasiões.

O Durkheim nos ensina que “não há ciência isenta de pressupostos” e abordando essa ótica (tem inúmeras outras que poderiam ser usadas), a literatura por meio de sua liberdade de criação e da não necessidade de explicar racionalmente os devaneios, acaba abrindo portas para que a filosofia e outras ciências passem a estudar o que foi
descrito na ficção. Em outras palavras: a literatura além de ser um deleite para a “alma” e de nos encantar com outros mundos, ainda é um tubo de ensaio, e permite que ideias do nosso inconsciente surjam, até que em um dado momento, uma ciência como a filosofia estuda o tema, abordando o método científico, até que passamos a entender mais sobre nós mesmos e não apenas no aspecto subjetivo da arte literária, mas também na “objetividade” científica. Um exemplo clássico é o inconsciente, que foi explorado por centenas de autores, até ser estudado por Freud e, posteriormente, por uma ramificação da neurociência e outras áreas do conhecimento.

O meu viés professoral é marcado pela necessidade de explicar, de dar exemplos. A literatura faz exatamente isso: ela apresenta o enredo, que serve de exemplo e que pode ser migrado para a vida dos leitores. Um leitor de Crime e Castigo, refletirá sobre a culpa, sobre a liberdade e se colocará no lugar do protagonista, imaginando o que faria e o que
não faria se estivesse na mesma situação. August Comte usava esse método para instruir em sua “religião positiva”. Se até o “fundador” da sociologia entendeu que é preciso simplificar conceitos, mas sem mutilá-los, a literatura, nesse sentido, oferece a melhor solução para que façamos algo semelhante.

Com toda a certeza. A diferença está na linguagem e no encantamento. Na filosofia é necessário ter um vasto aparato imaginativo para traduzir os conceitos abstratos para o nosso universo semântico. Na literatura há uma linha de interpretação e é possível trocar de lugar com os personagens.
Não quero dizer com isso que a literatura é mais fácil do que filosofia, pois, por exemplo, quem lê Borges terá muito mais dificuldades que o leitor de Rousseau. O que há é diversificação de métodos, já que alguns leitores preferem o texto filosófico e outros, o texto literário. É muito particular essa preferência e cabe aos escritores proverem meios
de suprir a diversidade de leitores.

A questão que mais preocupa não é a capacidade de o leitor ler algo, pois acho que o leitor médio consegue ter acesso a um conteúdo bem elaborado, desde que devidamente contextualizado. O desafio é levar esse leitor a iniciar a leitura de um texto clássico ou, no caso dos meus livros, de textos que apresentam autores clássicos. Há uma escolha a ser
feita: vender exemplares de livros por meio de uma escrita banal e que está na moda ou
manter um rigor teórico, através de uma linguagem acessível? Eu prefiro arriscar no rigor teórico e fazer com que o leitor apaixonado tenha livros em que possa ler de corpo e alma. A leitura filosófica e dos meus livros também, é igual a paixão: ela não admite concorrência. Não dá para ler filosofia e ouvir música, conversar com o colega do lado ou coisa do tipo. Ou você abre o livro para ler e se concentrar na subjetividade e mesmo na escrita objetiva, ou o texto não terá sentido. Claro que em relação a música, tem algumas pessoas que por hábito gostam de um fundo musical. O que quis dizer é que essa leitura exige atenção plena

Sim, de fazer com que o ser humano não seja “moído pelo moinho da realidade” (nos termos de Cartola) e vislumbre outras possibilidades de vida. O mundo não está acabado.
Não chegamos no ápice da civilização. Não é possível que o máximo que o ser humano consiga é acumular riqueza e desfrutar dos bens. A literatura e a filosofia nos ensinam a sonhar com um mundo melhor e a tentar evitar que ele piore, porque acredite: nada é tão ruim que não possa piorar.

O tempo. Ninguém fala de temas filosóficos complexos, sem ter lido milhares de obras,vários comentadores, ter assistido palestras e dedicado dias em para compreender algo obscuro. Ninguém é escritor sem ser essencialmente um leitor.

Ambos fazem parte da Coleção Epopeia das Letras, que contará com 7 volumes: Platão é o primeiro, depois Shakespeare, Freud, Camus, Kafka, Aluísio Azevedo e finalmente Dostoiévski. A linha é a mesma em ambos os livros: apresentar aos leitores trechos de todas as obras conhecidas de cada autor e a explicação, com contexto histórico e exemplos daquilo que o texto original apresenta.

Em Platão Além da Caverna, o leitor encontrará os textos do filósofo divididos por épocas, a evolução do pensamento, a explicação da região geográfica da qual cada personagem dos diálogos veio e o contexto político da época. Em menos de 200 páginas, será possível ter uma compreensão vasta sobre Platão. Compreensão essa que não está disponível em nenhum livro até a presente data, já que não se trata de meras explicações gerais e sim de uma abordagem totalizante. No Banquete, por exemplo, há quatro definições de amor e que são explicadas por exemplos atuais. Na República e nas Leis, há a evolução do pensamento político do filósofo e o mesmo ocorre em todos os diálogos conhecido do autor. Nos diálogos de juventude, o leitor poderá entender como o método de filosofar platônico foi se desenvolvendo e perceberá que muitas das chamadas “aporias” da juventude, foram sanadas na velhice.

Em Freud Além do Inconsciente, o leitor poderá pesquisar qualquer tema que desejar da teoria freudiana, sem esconder os fracassos que autor teve no início, mas deixando claro como que a psicanálise freudiana foi produto de muito trabalho. O livro também possui uma divisão racional, podendo ser usado como um material de consulta rápido e prático
(para quem deseja pesquisar apenas uma obra) ou um texto vasto para quem quer conhecer Freud na totalidade. A psicanálise avançou muito desde Freud e com certeza não seria mais aplicável em nossos dias, mas a teoria freudiana se constitui, e é importante dizer isso, de uma epistemologia das mais complexas e abrangentes. Em outras palavras: não lemos Freud em busca de um tratamento e achando que seremos analistas após a leitura, mas lemos para compreender “quem somos nós” e do que somos constituídos. Nesse sentido, Freud é tão atual quanto a nossa neurociência e esse o viés que apresento em meu livro.
Quanta a expectativa pelos meus livros é bem difícil dizer. O escritor contemporâneo disputa espaço com todos os escritores que já viveram e com inúmeras outras atividades que proliferam nesse mundo líquido. A minha maior dificuldade é fazer com que o leitor abra meu livro, porque ainda estou começando a fazer a divulgação. Uma vez que essa primeira barreira for superada, tenho plena convicção de que os livros serão bem recepcionados, porque foram produzidos com muito rigor teórico.

Outra questão: desejo que não parem nos meus livros e que saiam deles para mergulhar nos textos clássicos que faço referência.

Leia muito, domine o tema, faça imersão no autor. Quando escrevo uma crítica (sempre em momentos que estou isolado) eu penso como o autor, me imagino no lugar dele e vivencio “na pele” o que ele está escrevendo. É parecido com o ator que vai incorporar o personagem, com a diferença que antes de incorporar, eu terei lido tudo o que ele escreveu, rascunhos daquilo que ele pensou escrever, dados de parentes, possíveis relações e por aí vai. Reúna todas as informações que puder e não que isso lhe garantirá o saber absoluto sobre um tema, isso nunca, mas é obrigação do escritor aprender o máximo que puder, para que as lacunas técnicas sejam mínimas.

CADASTRE-SE PARA PARTICIPAR DOS NOSSOS SORTEIO, TODOS OS MESES.

Ana Carolina

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